Este Renault Clio parece 1.0, mas tem motor 2.0 turbo de 504 cavalos

Por: Giuliano Gonçalves / Fotos: João Mantovani

Quem vê esse Cliozinho “1.0” rodando por São Bernardo do Campo (SP), não imagina do que ele é capaz! Digo isso porque senti na pele o que é ser enganado por um carro: jamais sonhei que andaria em um Renault tão forte! E, se você acha que estou exagerando na rasgação de seda, dê uma olhadinha na potência. Sim, aqueles 504 cavalos e 54 kgfm de torque são dele!

“Mas, por que se arriscar em um desafio tão incomum?”, perguntei a Carmelo Fiumara, empresário de 30 anos e dono do Clio. E ele prontamente me explicou: “Sou de família italiana e tive a oportunidade de viver algum tempo por lá. Se aqui os ‘AP’ são os temidos, na Itália (e na França) os Clio dominam, com direito até a apelidos como ‘rivais de Ferrari’”, justifica, acrescentando que todos de sua casa são vidrados em carros de alta performance. “Está no DNA”, brincou.

Então, com a faca e o queijo na mão, já que tinha um 1.0 2011 guardadinho na garagem, ele voltou ao Brasil com todas as receitas adquiridas na Europa. “Só precisava de alguém disposto a peitar o desafio. E, por sorte, encontrei o pessoal da Motorfort, aqui de SBC”, completa Carmelo. Com o motor 1.0, entretanto, esse sonho estava longe de acontecer, já que o 1.6 16V hatch parou de ser fabricado em 2008 e o sedan, em 2009. Assim, Carmelo foi atrás de um propulsor 2.0 16V F4R, original dos primeiros Scénic importados para o Brasil, em 2001 (depois disso, restaram apenas os 8V). E ele tirou a sorte grande: achou um documentado, com câmbio. “Como se tratava de uma ‘mosca branca’, vibrei de alegria e arrematei na hora”, lembra, entre uma esticada e outra com o carro. E eu, no banco do passageiro com o meu gravador de voz ligado, só tinha olhos para a pista: a cada troca de marcha, segurava mais forte no puxador da porta, rezando para o jogo de freios dianteiro de Scénic dar conta da parada!

Mas, bastou um pouco de tempo a bordo para perceber que aquilo era um projeto altamente seguro, desenvolvido com muita dedicação pelos irmãos Rafael Pagliuca e Fernando Muñoz, sócios na Motorfort — em alguns minutos, já conversava mais tranquilo com Carmelo, curtindo a caranga no conforto do ar-condicionado. “Tudo funciona perfeitamente, Giu. Quando revelo a potência do carro, ninguém acredita, porque ele funciona como um original”, vibra o dono, encostando o carro e mostrando a marcha lenta lisa, sem qualquer oscilação.

Para chegar ao resultado (e para o espanto do preparador), o trabalho foi um tanto simplificado. “Eu ainda não tinha mexido nesses carros, mas rapidamente percebi que seria bem tranquilo. O motor 2.0 16V F4R encaixa perfeitamente no cofre do Clio, sem nenhuma adaptação. Apenas os semieixos foram retrabalhados, pois os do Scénic são um pouco maiores”, aprovou Rafael, afirmando que inserir um AP no cofre de um VW 1.0, por exemplo, é muito mais trabalhoso.

Que o propulsor encaixa como uma luva, não restam dúvidas. Mas, se você precisar realizar qualquer manutenção, pode se preparar: todo o cofre está ocupado “até o talo”! Está tão preenchido, que precisei perguntar à Carmelo onde ficava o turbo Holset HX 35, pois definitivamente não estava encontrando. E ele logo apontou: “está ali, atrás do motor, escondido sobre uma proteção de alumínio”.

Antes que eu questionasse o porquê da cobertura prateada, Carmelo explicou: “o compressor esquentava muito o interior do carro, e a saída foi adotar essa proteção, além de um revestimento na parede corta-fogo”. E eu posso imaginar o calor que esse compressor enviava para o habitáculo — regulado com 1,7 kg de pressão, ele literalmente “acende” em condições extremas de trabalho.

Por telefone, Rafael me contou outras vantagens na preparação do pequeno francês: “vale a pena investir nesse carro, pois bielas (Saenz) e pistões (Iasa) forjados, por exemplo, têm à pronta entrega”, garantiu. Se você precisa de um cabeçote dimensionado para o “Clio 2.0”, com 10,5 de taxa, a Samacar já tem a receita: molas de BMW, travas e pratos especiais.

Fim do ensaio fotográfico, um breve aperto de mão e hora de ver o Renault “sumir na neblina”. Carmelo precisou apenas de primeira, segunda e terceira marchas para desaparecer da minha vista, deixando no ar apenas o ronco grave do escape de inox. Confesso que, depois dessa matéria, o Clio entrou para a minha lista de preferências de preparados. Quem sabe um dia…